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Entenda por que o Brasil pode usar defensivos agrícolas não registrados na Europa

Produtos utilizados no país não são obrigatoriamente necessários em outros lugares onde o inverno rigoroso reduz naturalmente pragas, doenças e seus danos.

  14/08/2018 - 09h00min

O debate em torno do Projeto de Lei 6299/2002, que propõe mudanças no processo que regulamenta os agrotóxicos no Brasil, reacendeu uma questão comum entre consumidores: por que usamos defensivos cuja utilização não é permitida na Europa? Muitos acreditam que, pelo fato de contar com o registro de alguns produtos que não são utilizados em outros países, o Brasil tem uma legislação falha. Entendimento que leva a crenças sem base científica, e que, em alguns casos, desvirtua a compreensão sobre pontos do atual Projeto de Lei.

Neste cenário, é importante esclarecer que muitos dos defensivos agrícolas responsáveis por gerar esse tipo de questionamento não foram proibidos na Europa: o que houve é que eles não foram registrados ou não tiveram seus registros renovados. E, muitas vezes, isso se dá pelo fato da agricultura europeia ter características diferentes da brasileira e não demandar a utilização de alguns produtos.

Os defensivos agrícolas são produzidos para combater pragas e doenças que acometem certas culturas e, dependendo das condições climáticas, podem se manifestar com maior intensidade. Um exemplo disso é o ataque mais severo nas lavouras brasileiras devido ao clima tropical. Produtos usados aqui podem não ser tão necessários em países onde o inverno rigoroso – muitas vezes com neve – reduz naturalmente a pressão das pragas. A demanda por certo produto varia conforme o tipo de praga, de cultura e das condições climáticas, influenciando o mercado. Ou seja, se não tiver demanda por determinado defensivo, não há a necessidade de registro ou renovação do registro do produto naquele país.

Regulamentações diferentes

Robson Barizon, pesquisador da Embrapa, destaca que os países têm estruturas regulatórias distintas e essa característica também é válida para o registro de agrotóxicos. Cada país apresenta uma abordagem para o gerenciamento do risco destas substâncias. Historicamente, a União Europeia tem se posicionado em um espectro mais restritivo com relação ao uso de agrotóxicos. Com isso, muitas moléculas foram banidas ou tiveram sua utilização restringida nos últimos anos. Segundo Barizon, vale ressaltar que, mesmo países com sistemas regulatórios notoriamente avançados, como os Estados Unidos, não compartilham dos mesmos princípios de salvaguarda observados entre os países europeus. E muitos agrotóxicos banidos, restritos ou que tiverem seus registros descontinuados na Europa ainda são comercializados nos EUA.

– Uma molécula pode ser banida ou restrita não somente por questões relacionadas à saúde humana, via ingestão de alimentos, mas também ao impacto sobre o ambiente. Assim, uma molécula que foi questionada pela Europa por fatores ambientais pode não representar um risco considerável pela ingestão de alimentos importados de países que utilizam esta molécula – explica Barizon.

O especialista completa que, desconsiderando a União Europeia – mais conservadora que o restante do mundo –, o Brasil está alinhado aos principais países agrícolas em relação à regulamentação de agrotóxicos.

Banimento ou ausência de registro?

Quando se fala de banimento e ausência de registro, pode-se causar certa confusão. Robson Barizon explica que banimento é quando o agrotóxico foi registrado em determinado país e, por meio de processos de reavaliação, conclui-se, com base em novas evidências científicas pós-registro, que a molécula não tem segurança para continuar sendo comercializada e seu registro é cancelado. Já a ausência de registro é quando a molécula nem mesmo foi registrada, seja porque o processo foi indeferido ou porque as empresas envolvidas optaram por não registrar aquele agrotóxico naquele mercado, que muitas vezes não demanda o seu uso.

– Vale chamar atenção para o fato de que, muitas vezes, a restrição de novas moléculas de agrotóxicos demandadas por produtores para necessidades específicas pode incentivar o comércio ilegal, uma vez que o Brasil tem vastas fronteiras com países que têm tradição agrícola e acesso a estes produtos.

Arte / ClicStudio
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