América vermelha

O SEQUESTRO

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MAIS CARO

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Publicado em 13 de setembro de 2016

Montoneros sequestraram Jorge e Juan Born, herdeiros do terceiro maior conglomerado da América Latina, numa ação que rendeu um resgate de US$ 60 milhões, disputado por guerrilheiros e por agentes da ditadura

REPORTAGEM

José Luis Costa

DEsign

Thais Longaray

Empresários argentinos, os irmãos Juan e Jorge Born eram herdeiros de um império econômico, a Bunge & Born – terceiro maior conglomerado da América Latina e uma das cinco principais beneficiadoras de cereais do planeta. Presente em mais de 30 países, era líder de mercado no Brasil, onde comandava a Samrig, no Rio Grande do Sul, e a Moinhos Santista, em São Paulo, além de dezenas de outras indústrias.

Sequestrados em 19 de setembro de 1974 pelo grupo guerrilheiro peronista Montoneros, em Buenos Aires, os dois irmãos foram libertados mediante pagamento de resgate de US$ 60 milhões, um recorde mundial – US$ 268,8 milhões em valores atualizados, o equivalente a R$ 872 milhões.

Juan passou seis meses no cativeiro, e Jorge, nove. O episódio virou manchete mundial e, recentemente, ganhou destaque no livro Born, escrito pela jornalista argentina María O'Donnell, 46 anos. Lançada apenas em espanhol, a obra será adaptada para o cinema até 2018 – os direitos autorais foram adquiridos pela mesma produtora de O Clã, recente sucesso do cinema portenho (e outro filme sobre sequestros reais, estes realizados por um ex-agente da ditadura).

– O sequestro dos Born foi um dos componentes que levaram ao golpe militar (em 1976). A Argentina enfrentava um momento de extrema violência e medo. O resgate rendeu muito aos montoneros, que combatiam o governo. A democracia era frágil, e os militares queriam acabar com a guerrilha e com o peronismo – avalia O'Donnell.

O duplo sequestro rendeu um resgate de milhões de dólares que se transformou em maldição. A caçada ao butim gerou disputas entre guerrilheiros e os militares que tomaram o poder na Argentina, provocando novos sequestros, roubos, torturas, até a derrocada gradual dos montoneros.

Líderes da organização se perderam na montanha de dinheiro que logo se espalhou pelo mundo. A grana foi parar nos bolsos de alguns deles, foi investida em campanhas eleitorais, em compra de banco nos EUA e até na ditadura cubana.

Obstinado em reaver a fortuna roubada, um dos sequestrados, Jorge Born, se aliou a um dos sequestradores, Rodolfo Galimberti, na mais famosa versão sul-americana da Síndrome de Estocolmo. Como amigos, recuperaram uma parte ínfima do resgate. Como sócios, se atrapalharam em um negócio que acabou em escândalo policial e financeiro.

A seguir, ZH reconstitui o sequestro mais caro da história, tomando por base o livro de O'Donnell e outros três – Galimberti: de Perón a Susana, de Montoneros a la CIA (2000), de Marcelo Larraquy e Roberto Caballero, Firmenich (2014), de Felipe Celesia e Pablo Weisberg, e Doble condena: la verdadera história de Roberto Quieto (2011), de Alejandra Vignoles –, além de entrevistas com historiadores, reportagens de ZH e documentos do Movimento de Justiça e Direitos Humanos.

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