o futuro da saúde

O humano do futuro já circula por aí, desvendando os caminhos da própria sobrevivência. A humanidade longeva de 2050 conhecerá o indivíduo no detalhe genético. A ciência fabricará “peças de reposição” e poderá consertar nossos mínimos “defeitos de fábrica”. Estaremos preparados?

 

o paciente do futuro tem sintomas: esquecimento, pressão alta, dor nas articulações. também tem um diagnóstico: longevidade aguda causada por desenvolvimento crônico.

Brincadeiras à parte, é tudo verdade. Até 2050, a mortalidade infantil deve cair substancialmente, e quase um quarto da humanidade terá mais de 60 anos, informou a Organização das Nações Unidas (ONU) na semana passada. Isso não quer dizer que não adoeceremos.

 

A humanidade longeva conhece cada vez melhor males degenerativos como demência, artrose, osteoporose e câncer. Mesmo em um cenário de avanços, há lugares onde doenças como a tuberculose persistem feito um fantasma mais velho do que a descoberta dos antibióticos. A ONU conclamou 33 países a extinguirem a doença, que mata 30 pessoas por dia no mundo. A saúde enquanto direito é apenas um sonho em grande parte do globo. Estima-se que 40% dos nascimentos em 2050 se darão na África Subsaariana, a região mais pobre de um continente acossado por vírus como o ebola e o HIV.

 

Temos de olhar a saúde além do remédio. Dos 10 bilhões de terráqueos de 2050, 7 bilhões viverão em cidades, onde o ar poluído, o sedentarismo, a má alimentação e o estresse podem contribuir para a incidência de doenças cardiovasculares, câncer, diabetes.

 

– Quatro grandes fatores interferem na qualidade de saúde: o estilo de vida, a  carga biológica, os fatores ambientais e o acesso a serviços de saúde. Estilo de vida tem um impacto de 53% nessa conta – afirma Mauro Félix, coordenador da graduação em Fisioterapia da Unisinos.

 

As ciências são eternamente jovens. Nas próximas páginas, dão as caras crianças-prodígio como a nanomedicina e a terapia gênica, que prometem tratamentos revolucionários nas décadas vindouras. Há estimativas otimistas que dizem que os bebês de hoje chegarão à vida adulta em um mundo onde o câncer será uma doença manejável como a hipertensão.

 

Será fundamental levar os avanços em saúde aos confins do mundo redondo que habitamos, pois, como as edições de Rumo sobre alimentação e mobilidade urbana indicaram, temos sido mais eficientes em inovar do que em distribuir as inovações que a humanidade produz. Cidadãos, governos, setor privado e sociedade civil organizada deverão fazer sua parte, também, no estímulo a modos de vida sadios, para que os cenários que se concretizem até 2050 sejam os melhores para todos. Quem viver verá.

 

 

EM TERMOS

 

privacidade relacional

Quando um paciente tiver acesso fácil ao seu genoma, será preciso discutir, do ponto de vista ético, a privacidade de parentes com quem ele pode compartilhar traços genéticos.

 

edição gênica

Técnica para alterar gênes específicos de um indivíduo, podendo corrigir predisposição a doenças ou mesmo curá-las. É promissora, também, contra câncer.

 

doenças negligenciadas

São doenças infecciosas ou parasitárias endêmicas de populações de baixa renda, como leishmaniose e doença de chagas, que atraem pouco investimento da indústria farmacêutica.

:: DE TRÁS PRA FRENTE

1982

1966

1962

1959

1955

1945

1924

Na primeira metade do século 20, a humanidade acreditou ter vencido males infecciosos que muito a maltrataram, como tuberculose, pneumonia e sífilis. Passou, então, a ter sonhos de biotecnologia, robótica e ciborguismo.

Ao ilustrar o consultório do futuro em 1982, o livro World of Tomorrow: Health and Medicine imaginou estações de diagnóstico automáticas e máquinas de remédio semelhantes às de refrigerante. O livro também previu que a ciência permitiria aos pais garantirem filhos nascidos em perfeita saúde – uma das controvérsias no campo da genética.

Em 1966, a revista Time projetou para 2000 a cura do câncer, à medida que desvendássemos os segredos escondidos nas células humanas –  a genética tem se empenhado. Também apostou que a perda de memória na velhice seria eliminada, mal imaginando que a demência seria um

dos males do século 21.

Em 1962, a revista Seleções fez uma série de previsões para 2002. Sonhou que doenças cardiovasculares, tão presentes em nossa sociedade sedentária e estressada, estariam perfeitamente sob controle. Mas também foi sensata: “Médicos passarão mais tempo prevenindo doenças do que curando”.

Em 1959, a coluna do designer futurista Arthur Radebaugh no jornal Chicago Tribune superestimou por pouco o advento da robótica na medicina. O “bisturi atômico” ilustrado por Radebaugh viabilizaria operações sem incisões nem sangramento, comandado por um médico em frente a um monitor, como o robô-cirurgião que tem sido usado em cirurgias com muita precisão e pouco sangue, inclusive no Hospital de Clínicas de Porto Alegre.

Em 1955, o jornal Charleston Gazette listou previsões ousadas para 1999. Por exemplo:

F - Um homem de 90 anos será considerado jovem

V - Câncer será tratado por vacina ou compostos radiativos

V - Dispositivos eletrônicos darão voz aos surdos-mudos

F - Todas as doenças infecciosas serão erradicadas

Descobridor da penicilina, Alexander Fleming, previu em entrevista ao The New York Times, em 1945, que as bactérias desenvolveriam resistência aos antibióticos. Ele estava certo: em 2050, as superbactérias podem matar mais que o câncer.

Em novembro de 1924, a revista Science and Invention imaginou um ciborgue dotado de órgãos artificiais movidos a bateria. Órgãos artificiais eram mais tangíveis do que computadores pessoais.