MARCOS BIZZOTTO, RAW IMAGE, AGÊNCIA O GLOBO, BD
O CERCO DA LAVA-JATO

Humberto Trezzi

humberto.trezzi@zerohora.com.br

Em 2016, começou

a caça a políticos

E ntre a idolatria de milhões e a descrença de muitos, a Lava-Jato é um furacão moralizante que ruma para seu quarto ano de abalo nos conluios político-empresariais do país. A ação conjunta de procuradores da República e policiais federais atirou no que viu – doleiros – e acertou no que não viu: os clientes deles, empresários e políticos que cartelizavam as principais obras do Brasil. Foram parar na cadeia, pela ordem, lobistas, servidores públicos envolvidos na partilha movida a suborno, duas dezenas de empresários e, por fim, políticos. Entre eles, ex-governadores, um senador e um ex-presidente da Câmara dos Deputados. Estão ainda na fila para julgamento dois ex-presidentes, Collor e Lula. E delatores começam a implicar agora o atual presidente, Michel Temer. A velocidade da Lava-Jato é vertiginosa, para os padrões judiciais. São 175 presos e 108 condenados em pouco mais de dois anos. Muitos suspeitos são presos e sentenciados no mesmo ano, para júbilo de grande parte da população, cansada das protelações de rotina dos tribunais. Desde 2014, quando Sergio Moro condenou apenas 11 réus, as denúncias e coleta de provas foram aperfeiçoadas, de tal forma que o juiz aumentou em 10 vezes o número de condenados. Dos R$ 10 bilhões desviados da Petrobras, já foram recuperados ou bloqueados
R$ 3,1 bilhões. Impressiona, além das cifras, o quilate dos alvos. Entre os empresários condenados, estão os dirigentes das maiores empreiteiras do país, alguns dos quais continuam na cadeia – como Marcelo Odebrecht (da construtora Odebrecht) e Leo Pinheiro (da OAS). Os principais doleiros também foram para trás das grades, como Alberto Youssef, que se transformou no maior delator da Lava-Jato. Entre os presos, há ainda militares condecorados e policiais federais, a mostrar que lobo também come lobo. Em 2016, começou a caça a políticos. O poderoso José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil e fundador do Partido dos Trabalhadores (PT), foi sentenciado a 23 anos de prisão. Os ex-deputados Pedro Corrêa (PP) e André Vargas (eleito pelo PT) foram condenados. Menos de duas semanas após perder o foro privilegiado, o ex-presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), foi parar na cadeia – e lá permanece. Arqui-inimigo de Cunha, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) aguarda julgamento. Outros ex-presidentes, como Fernando Collor (alvo de três inquéritos) e José Sarney (que um delator diz ter recebido R$ 16,5 milhões como propina), estão na mira. E também Renan Calheiros (PMDB-AL), presidente do Senado e alvo de oito inquéritos da Lava-Jato. E vem mais por aí. A delação dos dirigentes da Odebrecht, a maior feita até agora, aponta pelo menos 230 políticos como beneficiários de propina. Entre eles, o presidente Michel Temer. Cabem críticas? Certamente. Uma delas é que os políticos representam apenas 5% dos condenados pela operação. Por força do foro privilegiado, o ritmo dos julgamentos em Brasília está longe da velocidade imprimida por Moro em Curitiba. Lentidão que beneficia, com possível prescrição dos crimes, gente como Collor e Calheiros. Mais 50 parlamentares estão sob investigação desde o ano passado. Outro questionamento é quanto ao fervor quase messiânico de envolvidos na investigação, capazes de defender medidas duvidosas, como uso de provas colhidas de forma ilícita por policiais (ideia derrubada no Congresso). Muitos estranham, também, que a Lava-Jato não atingiu governos anteriores a Lula. O próprio juiz Moro ajudou, involuntariamente, a alimentar a teoria de que tucanos não serão alcançados ao se deixar fotografar aos cochichos e sorrisos com o senador Aécio Neves (PSDB-MG).
EPISÓDIOS MARCANTES A CONDUÇÃO DE LULA O Brasil acorda em polvorosa no dia 4 de março, com a notícia de que Lula foi alvo de condução coercitiva para depor no aeroporto de Congonhas, em São Paulo. Em pronunciamento, Lula diz que “acertaram o rabo da jararaca, mas não mataram”. OS ÁUDIOS DE LULA Também em março, Sergio Moro divulga áudios de ligações telefônicas de Lula após a nomeação do ex-presidente como ministro da casa Civil. Na interpretação do juiz, a conversa com Dilma sugere que a nomeação é uma forma de proteger Lula da Lava-Jato, dando-lhe foro privilegiado. Os áudios ainda revelam conversas de Lula, sua mulher e seus filhos em que, segundo a força-tarefa, há evidências de que o ex-presidente é o real dono do sítio de Atibaia e do tríplex do Guarujá. CONDENAÇÃO DE ODEBRECHT Empresário Marcelo Odebrecht é condenado em primeira instância por corrupção ativa, lavagem de dinheiro e associação criminosa. O POWERPOINT Em setembro, em apresentação polêmica, o procurador Deltan Dallagnol afirma que Lula é o “chefe da quadrilha” que se instalou na Petrobras. PALOCCI Ex-ministro dos governos Lula e Dilma, Antonio Palocci é preso em setembro. Ele é acusado de pedir verbas de propinas para a campanha presidencial de Dilma em 2010. CUNHA Alvo de inúmeras denúncias e afastado da presidência da Câmara, Eduardo Cunha é preso em 19 de outubro. A acusação: recebimento de propinas e lavagem de dinheiro. CABRAL Preso na Operação Calicute, o ex-governador do Rio de Janeiro Sérgio Cabral torna-se réu na Lava-Jato por corrupção passiva e lavagem de dinheiro.